quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Histórias do Dono do Café Sto. Antônio por Antonio Hygino de Freitas

Naquele tempo, em Conceição da Boa Vista, dava nome de bar, quando tinha cadeira pra sentar e de botequim, quando não tinha. A gente ficava em pé mesmo. Lá em casa, por exemplo, tinha um corredor e o pessoal de Recreio já estava acostumado com ele e nele mesmo bebiam e comiam.
Quando eu ia em Recreio, era comum ouvir, Qualquer dia eu vou aparecer lá no seu botequim, em Conceição.
Minha mãe, Ana Hygino, fazia as coisas na cozinha e eu servia o pessoal. O botequim era a minha própria casa, ficava na Praça Sto. Antônio, que hoje tem outro nome e nela tinha uma igrejinha do mesmo santo e que ainda existe. Foi um tempo muito bom, pena que não tem mais esta casa, porque depois que minha mãe morreu, o Jair, meu irmão, passou a morar nela. Anos mais tarde veio a falecer, deixando a casa pros seus filhos, todavia, sua filha, Leci, construiu uma nova no seu lugar e logo em seguida vendeu.
Pois bem, na época que eu vivi em Conceição, aconteceu uma história de verdade, que vale a pena contar.
Meu tio Quirino tinha um botequim, com uma sinuquinha e um movimento muito bom. Este meu tio era tratado como Quirininho, muito alegre e gozador. Acontece que ele tinha um freguês muito frequente, conhecido como Cabralinho e a história que eu vou contar, começa e termina com ele.
Cabralinho era um homem de meia idade e baixinho, quando bebia, ficava muito tonto, mas nunca caía.
Pois bem, tudo começou numa noite muito escura. Meu tio, do balcão, virou pro Cabralinho e disse, num tom sério, querendo rir, Cabralinho, tenho aqui um dinheiro e ele é todo seu, se você tiver a coragem de ir lá no cemitério agora, buscar um osso ou o crânio de uma caveira, que estão no forno. 
Já bem calibrado, Cabralinho respondeu, Uai, é pra já! Pode deixá que eu vou buscá esse osso! Falando isso tomou mais um gole e saiu correndo como um louco e já era quase meia-noite. 
É bom lembrar que o cemitério era longe, tinha que subir um caminho longo que dava até no morro, onde estavam a igreja e o cemitério atrás dela.
Meu tio, Quirino, era um homem que tudo que fazia, ele preparava antes. Vendo o Cabralinho sair, ele pegou um lençol branco, que estava de baixo do balcão e partiu atrás, indo por um atalho, que poucos conheciam. Chegando  primeiro, rapidamente se enrolou no lençol e ficou esperando atrás de um túmulo.
Quando Cabralinho chegou cansado, tinha uma luazinha que ajudava clarear muito pouco. Pois é, quando ele aproximou de um  forno, lugar onde ficavam ossos desenterrados pra dar lugar a outros na sepultura, ele ouviu uma voz cavernosa, porque o meu tio era bom nisso, Cabralinho, não mexe em nada!!!
Acontece que o Cabralinho não se assustava facilmente e continuava a pegar os ossos. Cada um que pegava, ele ouvia, Não, este aí é da minha avó!!!, este é do meu avô!!!, este é do meu pai!!!, este é da minha mãe!!!. Mesmo assim ele continuava e quando pegou o último osso, meu tio se levantou atrás do túmulo e como um fantasma, berrou, Este osso é meu!!!, este osso é meu!!!  Cabralinho, vendo aquilo, ficou tão assustado, que saiu do cemitério, como um foguete, com o osso agarrado no peito. 
Como já disse que o meu tio conhecia um atalho, chegou bem na frente e, calmamente, foi pro balcão. E foi neste exato momento,  que Cabralinho apareceu, com o coração na boca e, sem desconfiar de nada, jogou o osso no balcão e falou, Taí o osso que você queria, me dá meu dinheiro pra cá! O pessoal não acreditava no que via, o osso estava realmente encima do balcão. 
É bom lembrar que esta história foi contada muitas vezes em Conceição e em Recreio. Mas, por causa dela, surgiu uma grande pergunta, Quem teve a coragem de levar o osso de volta pro cemitério?.

Nota, Meu pai contava muitas histórias e esta é mais uma delas, que encontrei na página 4, do fanzine, Mar de Morros, nº 40, de Novembro de 2002. 

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